A primeira vez que li um texto sobre o significado do termo “holístico” foi quando entrei na Unipaz em 2006. Era um texto curtinho e o título era super intrigante: Interregno: Holístico é… e não é…. Pierre Weil, o autor, dizia, entre outras afirmativas, que “holístico não é nova religião, nem nova filosofia, nem nova ciência, nem nova arte, nem novo partido político, nem nova forma de pensamento, ação ou sentimento […]. Holístico não é nova síntese, nem novo sincretismo, nem novo coquetel espiritualista ou materialista ou os dois…[…] Nem mistura de novos e/ou velhos… ismos e sobretudo não é comércio.”
Pierre Weil, sobretudo, tentava retomar o sentido desta palavra que ainda no início dos anos 1990 oferecia significados equivocados, dando margem a várias interpretações. Em várias de suas obras, posteriormente, pude notar seu esforço para explicitar o que é o paradigma holístico, a abordagem holística, a experiência holística e a visão holística.
A palavra “holística” vem do grego holos, que significa todo, inteiro. Tem a ver com a ideia de conjunto, do “todo” em relação com suas “partes”. Refere-se à inteireza do mundo e dos seres.
Segundo Weil (1990), o paradigma holístico considera cada elemento de um campo como um evento que reflete e contém todas as dimensões do campo. Pode ser comparado à metáfora do holograma. É uma visão, portanto, na qual ‘o todo’ e cada uma de suas sinergias estão estreitamente ligados, em interações constantes e paradoxais, opondo-se à visão newtoniana cartesiana de um universo fragmentado.
Weil (1990) define, então, a abordagem holística como o conjunto de métodos que permitem ao homem a compreensão da perspectiva holística e propõe que esses métodos sejam agrupados em duas grandes categorias, que ele denominou holologia e holopráxis.
A holologia se refere à busca do conhecimento holístico pelos caminhos intelectuais ou experimentais. Trata-se do estudo de textos, livros, pesquisas.
A holopráxis comporta os métodos que levam a uma vivência ou experiência holística direta pelo caminho das tradições sapienciais. É um caminho do despertar, seja pela contemplação cristã, invocação dos nomes sagrados, seja pelas diversas iogas do hinduísmo, ou das diversas meditações budistas, artes xamânicas, dança dos derviches da tradição sufi, ou ainda pelas primeiras tentativas modernas originárias da psicologia transpessoal, como a psicoterapia iniciática e a psicossíntese ou pela formulação científica contemporânea da Mindfulness, entre outros.
A experiência holística é resultado, particularmente, da holopráxis. É uma experiência que consiste em ultrapassar toda a dualidade, mediante uma vivência holística que integra e transcende a dualidade entre pessoal e transpessoal, e entre o mundo relativo e o absoluto, desembocando numa atitude de profunda compreensão e de presença em todos os atos da vida cotidiana, numa disponibilidade e abertura irrestritas em relação a toda criatura, num amor equânime e incondicional.
Assim sendo, a visão holística é estimulada pela abordagem holística, mas não necessariamente. Existem pessoas que chegaram à visão holística sem terem vivenciado a abordagem holística, pelo menos conhecida ou aparente.
O que eu chamo de “a grande sacada’ de Pierre Weil foi ele ter vinculado dois enfoques essencialmente complementares: o holístico e o transdisciplinar, para elaborar o que ele denominou abordagem transdisciplinar holística, que é a abordagem metodológica utilizada na Unipaz em todos os seus cursos e atividades.
O enfoque holístico traz a visão do todo-e-as-suas-partes e o enfoque transdisciplinar traz o olhar para o conhecimento, ao mesmo tempo respeitando e transcendendo as disciplinas, possibilitando uma nova compreensão integral do ser humano e do universo.
Assim, a abordagem transdisciplinar holística propõe uma visão não fragmentada da realidade e equilibra, no nível do indivíduo, as funções psíquicas: pensamento, sentimento, sensação e intuição e, no nível epistemológico, busca o diálogo entre Arte, Ciência, Filosofia e Tradições Espirituais, com o objetivo de formar o ser humano integral a fim de que ele compreenda o mundo presente, para o qual um dos imperativos é a unidade do conhecimento. O que norteia essa abordagem são os seus dois aspectos essenciais e inseparáveis, a holologia e a holopráxis, que contribuem enormemente para a formação do ser humano na sua inteireza.
Na visão subjetiva de Pierre, naquele mesmo texto que li ao entrar na Unipaz, ele afirmava o que o holístico é. “Holístico é o espaço de encontro de tudo que a mente humana separa e separou através dos tempos. Holístico é o calor de mãos dadas, dos corações unidos por cima das diferenças. Holístico é a oportunidade de enfrentar e sair de crises de existência. Holístico é o espaço irresistível que atrai todos que querem contribuir para salvar a vida do planeta, pela descoberta da interdependência de tudo, com tudo no grande todo incomensurável, transfinito e atemporal.”
Se você gostou deste texto e quer aprofundar a sua compreensão sobre a abordagem transdisciplinar holística, eu recomendo:
- Rumo à Nova Transdisciplinaridade: sistemas abertos de conhecimento. Weil, Pierre; D’Ambrosio, Ubiratan; Crema, Roberto. Editora Summus, São Paulo, 1993.
- Holística – uma Nova Visão e Abordagem do Real. Weil, Pierre. Editora Palas Athena, São Paulo, 1990.
- A Arte de Viver em Paz. Weil, Pierre. Editora Gente, São Paulo, 1993.
Heliane Carnevalli participa há 13 anos como membro da diretoria executiva, do conselho gestor e da equipe pedagógica da Unipaz São Paulo. Especialista em Transdisciplinaridade em Saúde, Educação e Liderança pela Universidade Internacional da Paz – Unipaz São Paulo e em Psicologia Transpessoal pela Alubrat – Associação Luso-Brasileira de Transpessoal. Formada em Letras e Pedagogia, atuou como professora e diretora de escola na rede pública estadual e como coordenadora pedagógica do Centro de Estudos de Línguas e da Oficina Pedagógica da Diretoria de Ensino Centro-Sul em São Paulo.