Unipaz São Paulo

UNIPAZ SÃO PAULO

Ter uma conversa com alguém ou ter um diálogo são coisas diferentes. Uma conversa pode ter o tom de monólogo quando só um fala, geralmente em tom de advertência ou repreensão. O diálogo imprime uma argumentação, uma troca de ideias onde há o tempo da fala e da escuta.

A proposta desse texto é o diálogo com o Corpo. O que o meu Corpo está me “dizendo” que eu preciso ouvir e acolher? O que eu tenho a perguntar e argumentar com ele? Durante muito tempo se teve a equivocada ideia do corpo como algo inferior, representação do “pecado”, da matéria, das nossas limitações com a idade e em um nível de menor importância em relação à mente, à consciência e à alma, dependendo da formação e crenças de cada um de nós.

O nosso corpo não é apenas a nossa morada neste mundo, mas é através dele que nossa Consciência se manifesta. E nele encontramos a porta do nosso Inconsciente. É na leitura dos gestos, da fala, da postura, das dores que se esconde a nossa Sombra e se manifesta a nossa Luz.

É o braço que se levanta para dar o “tapa” no outro, na situação para a qual se diz sim, quando queríamos ter dito não, porque violenta a alma, porque não se tem mais estímulo para fazer, mas persistimos fazendo… mas se desiste da ação no meio do caminho e se recolhe o braço, e surge a dor no ombro que impede o braço de se erguer, e limita o movimento do membro superior. 

É o pescoço que dói pelo peso na coluna cervical daquilo que carregamos na vida. É a dor na região lombar pelo que temos que aguentar, chegando, às vezes, a nos impedir de ficar em pé. Qual movimento estamos fazendo na nossa vida que não queremos mais fazer?

É o olhar que não encontra o olhar do outro quando falamos, “fugindo” como se o outro fosse “desvendar” a nossa alma. É na voz baixa, na fala de poucas palavras, para não se deixar perceber e decifrar. 

São as articulações das mãos que doem e se enrijecem pela raiva contida, do que se queria fazer e não pôde ou lhe foi “roubado”. É o joelho que dói e impede o caminhar, tornando o andar “duro”, mostrando a resistência na vida. O sintoma é o que nos falta, é a quebra de coerência entre o pensar, o sentir e o fazer, e a resposta está no corpo.

No processo de observação e cuidado, a relação do Terapeuta com o Sujeito do Cuidado pode ser simbolizada pelo mito grego do Minotauro, no qual Teseu, o herói, entra no labirinto e vence o Minotauro, saindo de lá guiado pelo fio tecido por sua amada Ariadne. Cabe ao Terapeuta promover o “setting” no qual o labirinto é o inconsciente onde se escondem nossos animais internos. Teseu, filho de um Deus e de uma mortal, portanto, nascido entre o “Céu” e a “Terra”, é o Sujeito do Cuidado, que atravessa corajosamente o labirinto do seu Inconsciente, nomeando seus animais internos, e o Minotauro é o sintoma. Teseu sai do labirinto guiado pelo fio do Amor até Ariadne, a pureza, o estado de Consciência que buscamos, a Saúde. O Minotauro traz, no nome, “Minos”, que significa pequeno, é a infância onde se originam nossos “animais interiores”, aos quais temos que aprender a dar nomes no processo de cura. Alimentamos esses pequenos animais ao longo da vida através de padrões repetidos e nocivos de comportamento, violando a nós mesmos, até que eles se tornam monstros que só serão abatidos pelo Amor, no caminho guiado pelo Terapeuta e que leva ao autocuidado, o amor a si próprio, que é a primeira dimensão do amor. O sintoma nos ajuda a entrar no labirinto, abrindo a porta para o que se esconde no inconsciente.

Segundo Annik de Souzenelle, o amor ascende ao corpo em três dimensões: os pés simbolizam o Ego – o Eu, o amor a si mesmo, os joelhos são o acesso ao Nós, o amor ao outro, e o quadril, o amor a eles, o amor universal. 

A passagem pela terceira porta implica na eliminação da mágoa, da raiva no coração. Iniciamos nossa trajetória do amor no ventre materno, onde somos o único ser do planeta útero (Eu/Ego) e o foco (ou não) do amor materno, e assim iniciamos nosso caminho para passarmos pela primeira porta. Saímos fisicamente do corpo materno pelo polo cefálico, mas somos apresentados ao mundo erguidos pelos pés. O caminho do homem é sair do ventre materno e ir em direção ao Outro e depois ao Amor Universal. As dimensões do Amor se somam, nunca se anulam. 

O corpo é o mapa de um caminho que precisa ser trilhado, tendo como guia a bússola da observação, do cuidado, do respeito e da intuição. O corpo é dividido ao meio pelo diafragma. A parte inferior simboliza a Terra, nossa ligação materna, e a parte superior, o Céu, o pai. A lateralidade direita é o Yang, a racionalidade, a força, o masculino, o pai, e a lateralidade esquerda é o Yin, a intuição, a emoção, a criatividade, o feminino, a mãe.

Os pés seriam a infância, o solo. Estamos “plantados” no chão, e na planta dos pés existem zonas reflexas que correspondem a todo o corpo e “contam” uma história. O tornozelo é geralmente o local dos entorses, a quebra da harmonia, as pulsões do Ego que impedem a ascensão do amor para a segunda porta. A ruptura do Tendão de Aquiles é a dualidade entre o Eu e o Nós, é preciso escolher para ascender. A pelve mobiliza os impulsos que dirigem o uso de habilidades e aptidões, a maleabilidade, ”o jogo de cintura” na vida. A pelve ensina sobre estar à vontade consigo e com o outro. Na região lombar estão os rins, centro gerador da segurança e distribuição da Energia Ancestral, lidamos aqui com o medo e a insegurança. A lombar travou porque faltou respeito por si próprio, limites para a autoexigência, é preciso reequilibrar o uso da força, o medo de não poder, o que se pode aguentar e o que não se quer mais aguentar e assim passar a porta do quadril para a terceira dimensão do amor, superando a mágoa, a raiva.

Todo sintoma é a expressão de uma “dor”, uma mancha, uma falha. O discurso do Sujeito pode ser traduzido pelos seus sintomas, através do seu corpo. O que lhe falta?  De onde vem essa dor?  Como você descreveria essa dor? Desde quando você tem essa dor, esse sintoma? O que essa dor lhe lembra, com o que ela se parece? Fale como estava a sua vida, algum tempo antes de aparecer essa dor, esse sintoma. 

Finalizo este texto com uma citação de Nereida Fontes Vilela, fisioterapeuta e terapeuta ocupacional, em seu livro Leitura corporal, a linguagem da emoção Inscrita no corpo: “Quando os impulsos são reconhecidos, aceitos, e transformados em ação, o que significa experimentação, a energia é modificada. Então evolui e é devolvida ao cosmo, integra-se à consciência universal e serve de alimento e estímulo para a criação e ativação de novos impulsos. A experiência é sentida e gravada por todos os Corpos e é registrada pelo Corpo Físico como um estado de fluência, de saúde e realização. A dança do Universo…

Quando os impulsos são inibidos ou desvirtuados, quando a fluência é alterada, a harmonia entre os Corpos é temporariamente desfeita. Eles começam a ser retidos e armazenados, primeiro em corpos mais sutis, e depois, no Corpo Físico. É quando a dança fica atravessada…”


Tania T. Pereira é médica pediatra e neonatologista, homeopata e acupunturiatra (Medicina Tradicional Chinesa e Acupuntura Neuromodulatória), com especialização em Auriculoterapia Francesa e Mobilização da Energia do Subconsciente (Qi Mental).

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